Despejos
derrubam casas e matam sonhos.
Doze perguntas de 130 famílias despejadas na
Ocupação Santa Maria em Vespasiano, MG.
Frei Gilvander Luís Moreira[1]
Com lágrimas nos
olhos e vozes embargadas, representantes das 130 famílias despejadas da
Ocupação Santa Maria, no dia 04 de novembro último, fizeram várias perguntas
que queimam como fogo, na Audiência Pública que ocorreu na Câmara de Vereadores
de Vespasiano, região metropolitana de Belo Horizonte, MG, dia 27 de novembro
de 2014. Em todo o processo, nesta audiência, foi a primeira vez que as
famílias tiveram a oportunidade de falar. Mas, suas casas e seus sonhos já
estavam destruídos. Restaram as perguntas, abaixo, e tantas outras silenciadas:
1)
“Por que só os ricos têm seus direitos
respeitados? Por que os direitos nossos, pobres e trabalhadores, são sempre
pisados?”
2)
“O
que o prefeito de Vespasiano, MG, Carlos Murta, fará para nós, 130 famílias
jogadas na pesadíssima cruz do aluguel, nas ruas, ou na cruz da humilhação que
é sobreviver de favor nas costas de parentes que, normalmente, também pagam
aluguéis? Há muitas famílias que estão nas ruas ou sobrevivendo em barracas de
lonas no quintal de parentes.”
3)
“Ten.
Cel. Alfredo, comandante do despejo, minha filha de 2,7 anos está na casa da
minha mãe com 39 graus de febre e sempre me pergunta: “Mamãe, por que a polícia
derrubou nossa casa e deixou a gente sem casa?””
4)
“Ten. Cel. Alfredo, como denunciar policiais
que pisaram em uma mãe que estava de resguardo, prenderam com truculência três
companheiros nossos, inclusive um cadeirante e um apoiador nosso, se os
policiais estavam sem identificação?”
5)
“Não
tivemos o direito de nos defender no processo. Fomos pegos de surpresa. Como
pode uma juíza assinar um papel mandando derrubar 80 casas de alvenaria e jogar
130 famílias nas ruas sem nenhuma alternativa digna?”
6)
“Estamos
aqui com muitas contas de aluguel para pagar. O prefeito de Vespasiano vai
pagar as nossas contas de aluguel?”
7)
“Perdi
a guarda dos meus quatro filhos, porque agora, debaixo da cruz do aluguel, não
tenho mais condições econômicas de sustentar meus filhos. Onde vamos encontrar
forças para continuar vivendo?”
8)
“Nossa
situação é muito precária. Tenho 72 anos e doença grave. Sou mãe de oito filhos
que dependem de mim. Eu preciso de moradia. Estou à beira da morte, sem forças
para guiar meus filhos. Quero saber o que vocês vão fazer por nós?”
9)
“Ocupamos
um terreno que estava abandonado. Era lugar de desova de cadáveres. Vários
funcionários da prefeitura disseram que o terreno era público. Ficamos lá oito
meses sem saber que havia um processo jurídico contra nós. Nunca fomos
intimados para nos defender. Por que só no final apareceu a empresa Lotearte
dizendo que era a proprietária?”
10)
“Um cadeirante que teve sua casa destruída e voltou
a morar no segundo andar da casa de sua mãe, um barraco na favela. Para sair de
lá precisa de pessoas carregá-lo através de uma escada. Até uma mulher com
alzaimer teve sua casa quebrada. Por que não respeitam o Estatuto do idoso, as pessoas
com deficiências e as crianças, inclusive as mulheres grávidas que moravam na
Ocupação?
11)
“Me Jogaram em um aluguel de 750 reais, mas
meu salário é o mínimo: 724 reais. Minha filha está tendo que ficar com minha
mãe, porque eu trabalho feito uma doida para tentar pagar as contas. Somos de
carne e osso. Não somos de ferro. Por que fizeram isso com a gente?”
12)
“Por que uma juíza manda derrubar casas sem
alternativa digna para crianças, idosos, cadeirantes e pessoas doentes? Por que
não arrumaram casas para nós antes de a gente ocupar lá?”
Em busca de respostas
para essas 12 perguntas que interpelam nossa consciência, seguiremos lutando,
de forma organizada e coletiva, para que a “sexta-feira da paixão” do dia 04 de
novembro de 2014, ocorrida na Ocupação Santa Maria, em Vespasiano, MG, se
transforme em um “Domingo de Ressurreição” com moradia própria, digna e
adequada para todas as famílias sem-casa do município. Aliás, com o papa
Francisco, alertamos: “Toda família tem direito a moradia própria e digna,
direito a terra e a seus direitos.”
Belo Horizonte, MG,
Brasil, 07 de dezembro de 2014.
[1] Frei e padre carmelita; bacharel e licenciado em
Filosofia pela UFPR, bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências
Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, Itália; doutorando em
Educação pela FAE/UFMG; assessor da CPT, CEBI, SAB, PJR, em Minas Gerais; e-mail: gilvanderlm@gmail.com –www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br
- www.twitter.com/gilvanderluis -
facebook: Gilvander Moreira
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