Enquanto
ordena o despejo de milhares de trabalhadores e trabalhadoras sem teto, Judiciário
brasileiro aprova “auxílio moradia”.
Thales Augusto
Nascimento Viote[1]
Os
juízes brasileiros estão liberados a receber auxílio moradia de até R$4.377,73,
sem prejuízo de seus ricos vencimentos salariais e diversas regalias. No último
dia 7 de outubro de 2014, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deliberou por
meio da Resolução n° 199 que os juízes brasileiros podem receber tal verba,
bastando que eles cumpram três requisitos: 1) estar trabalhando ou em licença
remunerada; 2) ele ou outro familiar com quem mora já não receba benefício
congênere; e 3) na cidade onde mora e trabalhe não haja residência oficial do
tribunal ao qual esteja vinculado (casas de propriedade do próprio tribunal).
Na
prática isso quer dizer que, independentemente de terem suas casas próprias
(fato notório e de fácil conclusão, tendo em vista os altos vencimentos
salariais da profissão de juiz, algo que pode chegar até R$32.703,09), os
juízes brasileiros podem receber tal privilégio, bastando que estejam na ativa,
outro parente com quem mora não recebe algo parecido e não haja na cidade onde
atuem casas pertencentes ao tribunal.
Esta
decisão é inaceitável, pois os juízes não precisam de dinheiro para pagar sua
moradia, uma vez que recebem vencimentos salariais altíssimos se comparados com
a grande massa de trabalhadores, o que faz com que em verdade estejam violando
o Princípio da Vedação do Enriquecimento Sem Causa, previsto no art. 884 do
Código Civil.
A
norma do Código Civil proíbe que as pessoas tirem dinheiro das outras sem
justificativa (sobretudo dinheiro público), e nesse caso não há dúvidas da
ilegalidade da benesse, pois qual seria a necessidade dos juízes brasileiros
receberem tal verba pública, se
já recebem altíssimos vencimentos salariais
que dá conta de arcar facilmente com moradias de luxo?
Ora,
por acaso algum trabalhador ou trabalhadora já viu um juiz morando em um bairro
de periferia? Claro que não, o que estamos acostumados a ver são juízes morando
em bairros e condomínios de luxo, o que inclusive contribui em muito para suas
decisões serem injustas, vez que estão distantes da realidade da ampla maioria
do povo.
Por
outro lado, como podem os juízes brasileiros, em sua ampla e geral maioria
advinda da elite burguesa querer dinheiro para realizar o seu “direito à
moradia”, constantemente negam o direito à moradia de milhares de famílias
trabalhadoras sem teto?
Para se ter uma
ideia, os juízes mineiros que determinaram por suas decisões o despejo de mais
de 8.000 famílias das ocupações urbanas Vitória, Esperança e Rosa Leão
(Comunidade da Isidora), Luzia Divina, Bittencourt Marcondes e Selma Marques,
somente no mês de setembro de 2014 (informações extraídas do próprio site do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais), receberam vencimentos salariais líquidos
(ou seja, tirados os descontos) na ordem respectiva de R$20.789,29, R$27.946,01
e R$32.228,98 (isso sem contar as regalias que não são contabilizadas
individualmente, como carro oficial, motorista, farta e deliciosa alimentação,
tudo bancado com o suado dinheiro dos trabalhadores e trabalhadoras arrecado
por meio de impostos).
Enquanto isso, o
direito constitucional à moradia das ocupações urbanas é sistematicamente
violado pelo Judiciário brasileiro, que por suas decisões determinam despejos
forçados com uso de aparatos militares monstruosos (como vimos recentemente na
cidade de São Paulo), independente se as áreas ocupadas estavam há anos ociosas
e nas mãos da especulação imobiliária, portanto, ferindo o Princípio Constitucional
da Função Social da Propriedade Privada (art. 5°, XXIII da Constituição
brasileira).
Isso sem falar em
outras decisões que mantém os privilégios de sua classe, a burguesia, tais
como, dentre outras, de impedir a realização de greves de trabalhadores que
lutam pelo aumento de seus miseráveis salários, e de permitir o aumento
indevido e injustificado de passagens de ônibus.
Com isso, o
Judiciário brasileiro mostra mais uma vez a sua consciência de classe
(burguesa), pois utiliza-se de artifícios da legislação para aumentar sua
riqueza em detrimento da classe trabalhadora, que sofre com ordens de despejo
violentos e injustos e outras de suas decisões injustas e ilegítimas.
Belo Horizonte, MG,
Brasil, 08/12/2014.
[1] Advogado popular,
membro do Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular e militante do Partido
Comunista Revolucionário. Email: thalesviote@gmail.com
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