segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Enquanto ordena o despejo de milhares de trabalhadores e trabalhadoras sem teto, Judiciário brasileiro aprova “auxílio moradia”.



Enquanto ordena o despejo de milhares de trabalhadores e trabalhadoras sem teto, Judiciário brasileiro aprova “auxílio moradia”.
Thales Augusto Nascimento Viote[1]

         Os juízes brasileiros estão liberados a receber auxílio moradia de até R$4.377,73, sem prejuízo de seus ricos vencimentos salariais e diversas regalias. No último dia 7 de outubro de 2014, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deliberou por meio da Resolução n° 199 que os juízes brasileiros podem receber tal verba, bastando que eles cumpram três requisitos: 1) estar trabalhando ou em licença remunerada; 2) ele ou outro familiar com quem mora já não receba benefício congênere; e 3) na cidade onde mora e trabalhe não haja residência oficial do tribunal ao qual esteja vinculado (casas de propriedade do próprio tribunal).
         Na prática isso quer dizer que, independentemente de terem suas casas próprias (fato notório e de fácil conclusão, tendo em vista os altos vencimentos salariais da profissão de juiz, algo que pode chegar até R$32.703,09), os juízes brasileiros podem receber tal privilégio, bastando que estejam na ativa, outro parente com quem mora não recebe algo parecido e não haja na cidade onde atuem casas pertencentes ao tribunal.
         Esta decisão é inaceitável, pois os juízes não precisam de dinheiro para pagar sua moradia, uma vez que recebem vencimentos salariais altíssimos se comparados com a grande massa de trabalhadores, o que faz com que em verdade estejam violando o Princípio da Vedação do Enriquecimento Sem Causa, previsto no art. 884 do Código Civil.
         A norma do Código Civil proíbe que as pessoas tirem dinheiro das outras sem justificativa (sobretudo dinheiro público), e nesse caso não há dúvidas da ilegalidade da benesse, pois qual seria a necessidade dos juízes brasileiros receberem tal verba pública, se
já recebem altíssimos vencimentos salariais que dá conta de arcar facilmente com moradias de luxo?
         Ora, por acaso algum trabalhador ou trabalhadora já viu um juiz morando em um bairro de periferia? Claro que não, o que estamos acostumados a ver são juízes morando em bairros e condomínios de luxo, o que inclusive contribui em muito para suas decisões serem injustas, vez que estão distantes da realidade da ampla maioria do povo.
         Por outro lado, como podem os juízes brasileiros, em sua ampla e geral maioria advinda da elite burguesa querer dinheiro para realizar o seu “direito à moradia”, constantemente negam o direito à moradia de milhares de famílias trabalhadoras sem teto?
Para se ter uma ideia, os juízes mineiros que determinaram por suas decisões o despejo de mais de 8.000 famílias das ocupações urbanas Vitória, Esperança e Rosa Leão (Comunidade da Isidora), Luzia Divina, Bittencourt Marcondes e Selma Marques, somente no mês de setembro de 2014 (informações extraídas do próprio site do Tribunal de Justiça de Minas Gerais), receberam vencimentos salariais líquidos (ou seja, tirados os descontos) na ordem respectiva de R$20.789,29, R$27.946,01 e R$32.228,98 (isso sem contar as regalias que não são contabilizadas individualmente, como carro oficial, motorista, farta e deliciosa alimentação, tudo bancado com o suado dinheiro dos trabalhadores e trabalhadoras arrecado por meio de impostos).
Enquanto isso, o direito constitucional à moradia das ocupações urbanas é sistematicamente violado pelo Judiciário brasileiro, que por suas decisões determinam despejos forçados com uso de aparatos militares monstruosos (como vimos recentemente na cidade de São Paulo), independente se as áreas ocupadas estavam há anos ociosas e nas mãos da especulação imobiliária, portanto, ferindo o Princípio Constitucional da Função Social da Propriedade Privada (art. 5°, XXIII da Constituição brasileira).
Isso sem falar em outras decisões que mantém os privilégios de sua classe, a burguesia, tais como, dentre outras, de impedir a realização de greves de trabalhadores que lutam pelo aumento de seus miseráveis salários, e de permitir o aumento indevido e injustificado de passagens de ônibus.
Com isso, o Judiciário brasileiro mostra mais uma vez a sua consciência de classe (burguesa), pois utiliza-se de artifícios da legislação para aumentar sua riqueza em detrimento da classe trabalhadora, que sofre com ordens de despejo violentos e injustos e outras de suas decisões injustas e ilegítimas.
Belo Horizonte, MG, Brasil, 08/12/2014.


[1] Advogado popular, membro do Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular e militante do Partido Comunista Revolucionário. Email: thalesviote@gmail.com

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