segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

O Povo da Ocupação Nelson Mandela está gritando por socorro. Nota Pública. BH, 12/01/2015

O Povo da Ocupação Nelson Mandela está gritando por socorro.
Nota Pública.


Belo Horizonte, MG, 12 de janeiro de 2015.

Ontem à noite, dia 11/01/2015, das 19 às 22:00h, aconteceu mais uma das inúmeras reuniões com as 50 famílias da Ocupação-comunidade Nelson Mandela, no Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte, MG, ao lado da Av. do Cardoso, n. 100. As famílias estão gritando por socorro. Comovente ver mães, avós, idosos, deficientes e crianças apreensivas, muito angustiadas, com a voz embargada, indignadas, sendo pisadas na sua dignidade humana, porque estão sob o pesado estresse da iminência e um despejo marcado para amanhã, terça-feira, dia 13/01/15, dia do fuzilamento do frei Caneca, em Recife, PE, em 1824, enquanto lutava contra a opressão da monarquia e dos poderes constituídos.
 Esperamos vivamente que ALTERNATIVA DIGNA, QUE É MORADIA PARA AS FAMÍLIAS, SEJA APRESENTADA PELA PREFEITURA DE BELO HORIZONTE e/ou PELO GOVERNO DE MG, antes que seja feito o despejo: arrancar as famílias de suas casinhas ou barracos construídos com muito suor e luta, após não suportarem mais a pesadíssima cruz do aluguel ou a humilhação que é sobreviver de favor. Tem que acabar a Era de despejos forçados de Ocupações SEM ALTERNATIVA DIGNA. Por isso o povo das Ocupações de BH, RMBH e MG, ocupações do Campo e da cidade, estão lutando, ao gritarem: Despejo Zero! Ouvimos de atuais secretários do Governador Pimentel que o PT em MG irá governar ouvindo o povo, dialogando com os movimentos sociais e que não haverá despejo sem negociação, sem alternativa digna. O 1º teste está lançado. Será com a Ocupação Nelson Mandela, da Serra, em BH.
Entenda o tamanho da injustiça que está ocorrendo com cerca de 50 famílias da Ocupação Nelson Mandela.
A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) está mais destruindo casas do que construindo, com política habitacional pífia, deixando o déficit habitacional crescer geometricamente: estima-se que 150 mil famílias estejam sem-casa em BH, debaixo da pesadíssima cruz do aluguel ou da humilhação que é sobreviver de favor. A especulação imobiliária correndo solta. A PBH vendendo imóveis ao invés de destiná-los para moradia popular. O programa Vila Viva (= Vila morta) só reassenta 50% das famílias e indeniza injustamente outros 50% que são expulsos da capital para as periferias da RMBH. As famílias da Ocupação Nelson Mandela são vítimas do Vila Viva: não foram reassentadas e não conseguiram mais pagar aluguéis cada vez mais caros, acima de 500 reais, inclusive há notícias de que têm pessoas que a própria prefeitura levou para o local depois de desapropriá-las, como é o caso dos carroceiros que moram na Comunidade.
A PBH não estava cuidando da área verde que foi ocupada. A bacia de contenção de enxurrada estava há cinco anos sem limpeza. A PBH só limpou a bacia de contenção de água após o povo da Ocupação pedir e insistir que a PBH fizesse a limpeza. A PBH retirou uns 100 caminhões de terra que entupiam o “ladrão” e a gaiola por onde a água do riacho deve passar. Logo, antes da limpeza poderia existir risco de rompimento da pequena barragem, mas hoje, com a limpeza feita e sem chuvas em BH, não há nenhum risco de rompimento da pequena barragem. Logo, é mentira o argumento de “risco iminente” de rompimento de barragem, o que causaria inundação etc” e mesmo que isto fosse verdade, o que justifica tirar de um risco geológico e jogar ainda mais no risco social, nas ruas?
O processo de reintegração de posse foi julgado na 3ª Vara da Fazenda Pública Municipal, pelo juiz Wauner Batista Ferreira Machado, n. 0024.14.003.707-8, que determinou a reintegração de posse, mesmo diante da situação de extrema vulnerabilidade socioeconômica da comunidade atingida. As cerca de 50 famílias que ali se alojaram fugiam do pagamento de pesados aluguéis e, em especial, da situação de rua.
Deferida a ordem de despejo e sem qualquer alternativa proposta pela Prefeitura de Belo Horizonte, que chegou, através de um de seus representantes, em reunião conduzida pela PMMG para nivelamento e execução da ordem, a mencionar que não haveria qualquer responsabilidade pública já que “aquelas pessoas não brotaram ali” e, portanto, com certeza, teriam lugar para onde ir após serem expulsos da localidade, a pedido das famílias, o Ministério Público da área de Direitos Humanos propôs Ação Civil Pública (ACP) (n. 0845405-29.2014.8.13.0024). A ação foi proposta em conexão à reintegração de posse, portanto, perante a 3ª Vara da Fazenda Pública Municipal, e tem três objetivos: a) realização de cadastro das famílias residentes na comunidade Nelson Mandela; b) a oferta de abrigamento temporário, após cumprimento da reintegração, que abrangesse as famílias previamente cadastradas; c) a inserção das mesmas em programa habitacional que contemplasse o direito a moradia em sua plenitude. Assim, o MP busca-se, tão somente, a oferta de condições dignas às famílias que ali constituíram seus lares. O Juiz da 3ª Vara determinou a realização de levantamento socioeconômico da comunidade, o que se efetivou através do Programa Polos de Cidadania da UFMG e consta do processo da Ação Civil Pública. A PBH se omitiu e não quis fazer o cadastro. Não obstante estar demonstrada a omissão da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, o feito em questão não obteve decisão judicial sobre o pedido de liminar, que viabilizasse a saída digna dos moradores da localidade. Lamentavelmente e estranhamente, o juiz da 3ª Vara não julgou a ACP do MP/MG.
Na sequência, em 19/12/2014, o juiz da 3ª Vara da Fazenda Pública Municipal reiterou a ordem de despejo, impondo, inclusive, multa de 300 mil reais por dia em caso de não oferecimento de apoio por parte da Polícia Militar de Minas Gerais. Ora, a ordem deveria ser cumprida no período natalino e de fim de ano, quando, inclusive, vigora o recesso forense.
Porém, diante de dificuldades de ordem operacional, a PMMG solicitou ao Juiz de plantão, Magid Nauef Láuar, a concessão de prazo até 20/01/2015 para cumprimento da ordem, objetivando superar a época natalina e de virada de ano. O Juiz de plantão deliberou por abrir vista à PBH, pelo prazo de 05 dias e, na sequência, concedeu prazo até dia 20/01/2015 para cumprimento do despejo, reiterando a ordem de prestação de auxílio por parte da PMMG, com as mesmas multas outrora impostas.
O juiz Magid, em despacho de 30/12/2014, afirma: “O Município de Belo Horizonte, por sua vez, somente veio denunciar o não cumprimento da ordem judicial no dia 19 de dezembro de 2014, mesmo tendo conhecimento de que a decisão foi submetida a recurso e que tinha transitado em julgado. Ou seja, o maior interessado, o Autor nestes autos, esperou 10 (dez) meses para dizer ao Poder Judiciário que a Polícia Militar de Minas Gerais não estava dando o apoio necessário para cumprimento da decisão judicial!”
O Ministério Público, em 29/12/2014, protocolou duas petições, tanto na ação de reintegração quanto na ação civil pública, reiterando a necessidade de se construir uma alternativa para as famílias ali assentadas, sob pena de agravamento do problema, com o retorno destas para a rua e o agravamento do caos social. As petições foram instruídas com imagens atualizadas – fotos e vídeos - das pessoas ali residentes, bem como com relatório elaborado por Conselheiro Tutelar, acerca das condições das dezenas de crianças existentes.  Mas , estranhamente, as petições do Ministério Público não foram ainda examinadas. Dia 09/01/2015, foi realizada reunião de nivelamento com a PMMG, onde, conforme consta em Ata, ficou clara a ausência de alternativa digna para as famílias.
 Como é de amplo conhecimento, Belo Horizonte não possui abrigos familiares, sendo que os existentes NÃO PERMITEM A PRESENÇA DE CRIANÇAS. Os abrigos da capital mineira possuem alas distintas para homens e mulheres, o que implica, CASO TIVESSEM VAGAS, em separação obrigatória dos núcleos familiares sem qualquer perspectiva temporal. A situação é tão grave que a própria Polícia Militar encontra dificuldades em cumprir uma ordem que tem contornos de tragédia anunciada e pode implicar em grande injustiça social. Os comandantes da PM, nesse caso concreto, até aqui, tem tido comportamento ético e estão sensíveis aos apelos das famílias. Inclusive a PM está torcendo para que apareça alternativa digna para as famílias. Ganha especial relevo ainda o fato de que as famílias sequer foram cadastradas pela PBH, o que dificulta até mesmo a execução do despejo.
Notas, fotos e muitos vídeos que contribuem no esclarecimento desse conflito social estão no Blog www.ocupacaonelsonmandelaserrabh.blogspot.com.br
 Destacamos que o relatório produzido pelo Programa Polos de Cidadania da UFMG, em decorrência de determinação judicial na ACP, informa que a comunidade da ocupação Nelson Mandela, em especial as crianças e idosos, mantém relação de pertencimento com a região, sendo que frequentam e tem acesso aos equipamentos públicos do Bairro da Serra, em especial, escolas e postos de saúde. O cumprimento do despejo com certeza implicará em danos concretos aos direitos das crianças e adolescentes, ante a iminência do início do período letivo e em prejuízo ao direito à saúde, ante a vinculação daquela comunidade aos postos de saúde ali existentes.
A partir de Relatório-laudo do Conselho Tutelar da Criança e adolescente, o Ministério Público peticionou ao TJMG requerendo que seja garantido os direitos inalienáveis das crianças e adolescentes, juntamente com suas famílias, obviamente. Uma petição foi feita na 3ª Vara da Fazenda Pública Municipal e outra Petição à Vara da Infância e da Juventude (n. 0132421-20.2015.8.13.0024), mas nenhuma decisão sobre essas petições até agora. Por que o TJMG não julga a ACP e várias petições do Ministério Público e decide pressionar a PMMG para cumprir Reintegração de posse sem alternativa digna para as famílias? Por que o TJMG não determinou que a PBH arrume moradia para as famílias? Cumpre recordar que o ex-juiz da 6ª Vara de Fazenda Estadual, Manoel dos Reis, há uns três anos, só determinou o despejo da Ocupação das Torres Gêmeas, ocupação de 17 anos, após colocar como condição que a PBH arrumasse moradia para todas as famílias.
Enfim, clamamos para que as autoridades políticas da PBH, do Governo de MG e do TJMG, proporcionem às famílias uma saída digna de seus lares, oportunizando ainda sua inserção em programas habitacionais que contemplem suas necessidades imediatas. Isso com urgência.
Assinam,
Moradores da Ocupação-comunidade Nelson Mandela
Comissão Pastoral da Terra (CPT)
 Brigadas Populares.


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